Prosa dos Ventos

Foto: Alda Carvalho olho para trás e interrogo a minha existência que pegadas duráveis deixei que rostos amei que batalhas travei ganhei ou perdi que fagulha de mim iluminou por momentos alguém em que tormentos ou dores me consumi que quotidianos transformei ou me transformaram a mim existência o que tenho eu feito de ti

Foto. Alda Carvalho Palavras inteiras   justas     verdadeiras ou palavras insensatas   mentirosas são poderosas pois são pensamento e emoção postos em acção As palavras são como um rio   fiozinho   na nascente a jusante maré enchente Palavra tanto é puro grito   como carícia   de fino linho punhal de afiado gume abraço   ou fofo ninho Palavras com o vento não vão uma vez ditas  ficam moem e remoem pensamento e   coração Mas sem palavras   como diríamos o que nos mata   o que nos dói o que nos salva   o que nos constrói o que nos inunda   o que nos afunda o que nos transforma  o que nos catapulta   nos dá asas   e nos faz voar Sem palavras e o silêncio das palavras não existíamos

Foto: Alda Carvalho Precisamos de espelhos para nos vermos nos sentirmos para existirmos espelhos sempre presentes mesmo se ausentes  ou indiferentes há espelhos deformantes irritantes há espelhos partidos espelhos desabridos há espelhos como facas afiadas espelhos que nos despem até aos ossos há espelhos límpidos transparentes como água clara espelhos que nos vestem de luz espelhos que reflectem a nossa voz espelhos que nos reflectem por inteiro mas os melhores espelhos são os olhos dos amigos e dos amantes neles reconhecemos os nossos desejos a nossa alma  o nosso ser profundo espelhos que reflectem o céu mais puro que me dizes tu espelho meu

Foto-Alda Carvalho Procura-se um guarda-chuva que proteja da chuva e do sol dos espirros e dos vírus dos gritos e da crua dor em suma  de todo o horror destes dias proibidos pode ser de qualquer cor mas que seja transparente o mais airoso possível um nadinha extravagante com um toque  de elegância e  sobretudo  invisível

Foto: Alda Carvalho que saudades de caminhar nestes tempos proibidos sentir a liberdade na pele palmilhar atalhos escondidos sentir aromas sensuais a libertar os sentidos ver nos fugazes sussurros encantos desconhecidos respirar a inteira liberdade navegando contra os ventos sorver os ecos da vida em caminhada de silêncios