Mensagens

A mostrar mensagens de agosto, 2018

À MINHA ÁRVORE

Hoje quero sentir o teu dossel verde na agitação das folhas tocadas pela brisa Quero sentir o roçagar de asas que te habitam e voam recortadas na luz da manhã Quero sentir a energia telúrica das tuas raízes como seiva suave a subir e a dar vida Quero sentir a tua presença serena liana imensa entre a terra e o céu

Desencontros

Sentada à mesa do café com um silêncio enorme dentro de mim olho para toda a gente que gesticula   mexe os lábios e ri Fantoches dum teatro mudo E quedo-me a meditar no absurdo esbracejar dos gestos desencontrados que se procuram    em vão encontrar

Tempo de ausências

O tempo não nos dá tempo é preciso chegar no mínimo tempo a qualquer lugar Não há tempo para sonhar nem para gostar não há tempo para olhar o caminho nem o caminhar Neste caos aparente em que mergulhamos não há tempo para pensar nem   tempo para desvendar o essencial e o diferente É preciso chegar no mínimo tempo a qualquer lugar Passamos pelas pessoas sem as amar pelas palavras sem as entender pelos gestos sem os suspeitar pelo silêncio sem o ouvir pela vida sem a agarrar Passamos puramente passamos É tempo de habitar as ausências agora É nas margens do caminho que o tempo se demora

Que sinais que vozes

Que sinais que vozes me chegam de longe ecos dum passado que aqui habitou vestígios de vidas há muito sonhadas há muito vividas Que sinais   que vozes algo distorcidas ainda circulam no fluir das águas Que rumos de vidas ainda ecoam nas curvas da estrada Que sinais   que vozes trazidas pelo vento ainda ressoam em meu pensamento São sonhos    são gritos quebrantos aflitos ou só quedas de água

Viajando no tempo

Descalça    desço a escadaria e os meus pés frios entram na rua quinhentista povoada de gente Viajo ao passado de sons e sensações por entre a vozearia ocupada em compras e vendas de objectos e de almas de prantos e de espantos E assim me misturo e deixo entre parênteses o meu canto Vestindo ora farrapos ora sedas e brocados arrasto-me nos sons dos cascos das bestas do tilintar das moedas da música dos metais e escuto os sinos chamando à oração numa babilónia de olhares objectos e sentimentos de vários lugares e tempos convergentes naquela rua de quinhentos

Fragilidade

Um estrondo contra o vidro seguido dum silêncio profundo Um pássaro ainda a palpitar jaz no parapeito da janela Pego nele com toda a cautela   - um sopro em extinção Rezo por ressurreição mas o corpo sem vida fica quieto na minha mão Chegou ao fim da viagem a iridescente plumagem Um muro de vidro liberdade aparente pôs fim ao voo subitamente

Constelações

Como cápsulas enfunadas flutuamos num universo imenso de ternura e senhores de nós e do mundo nos julgamos Estudamos das partículas às galáxias mas continuamos à procura da Luz na muda incerteza de quem somos Com as abelhas    os lírios    as estrelas as mesmas leis universais partilhamos mas isolados em universos paralelos descobrimo-nos sós Viajantes eternos    almejamos mergulhar num universo de ternura     quando a casca das nossas cápsulas se quebrar

Raposinha fulva

Imagem
Foto:Tiago Carvalho Raposinha fulva que surges na curva da estrada deserta cheia de silêncios longos para contar estás só no deserto escarpado e aberto de cores irreais nem tu sabes quanto teu olhar de espanto  me pode tocar

Quem tem olhos para ver o vento

Quem tem olhos para ver o vento os rostos acariciar sorver a água das fontes nos portais assobiar varrer o pó dos caminhos pôr as árvores a dançar Quem tem olhos para ver o vento esse ar em movimento sempre em movimento subir    descer     rodopiar em forma de suave brisa ou de forte furacão a cantar uma canção ou rugir como um leão como trinado de pássaro ou ribombar de trovão em passinhos de dança ou peso de um batalhão Quem tem olhos para ver o vento a partir ou a chegar agitar bandeiras derrubar fronteiras formar castelos no ar Quem tem olhos para ver o vento suspender o pensamento quem tem olhos para olhar

Procuro a rosa

Imagem
Nos escombros da existência procuro a rosa um rosto sem máscara um coração verdadeiro No crepúsculo do dia procuro a rosa uma cor sem mancha um pulsar sem dor No âma go do sentir procuro a rosa a metamorfose perfeita  desta ânsia de existir                                                                     Foto: Alda Carvalho