Preconceitos sobre abutres

Foto: Alda Carvalho

 


Dizem
  que os abutres são feios

que comem os restos de outros animais

que são necrófogos e não sei que mais

 

atentemos no voo

observemos a figura

deixemo-nos levar pela sua envergadura

 

como bombardeiros a cobrir o céu

rasam as nossas cabeças

planando apenas    

asas imensas

 

deixemos os preconceitos

e agradeçamos do ambiente a limpeza

e do voo a grandiosidade e beleza

 

 

Comentários

  1. Apesar de tudo o que a tua bela poesia diz deles e é verdade; apesar da beleza das asas planando, digo-te que visto totalmente o preconceito. Desgosto deles desde que dois ou três sobrevoaram, fatais, a casa de um tio muito doente. Não gosto deles desde que os vi próximos e feios como eles só (e isto não é preconceito, mas a realidade). Não gosto deles por serem quem são, ainda que lhes admita a necessidade. Porque este é o melhor dos mundos, tenho de reconhecer que esteja bem feito, tanto na vertente natural quanto animal. E louvo-te por conseguires transformar seres tão repelentes em poesia.
    Bom Ano, Prosa.
    Um abracinho doce

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  2. A cor de que mais gosto é o preto; melhor, talvez seja do cinzento antracite, um preto adocicado por laivos mais claros, não o preto acastanhado dos abutres europeus.
    Gosto do preto porque disfarça volumes indesejados e também porque nos obriga a uma observação detalhada da excelência do design de alguns dos objectos feitos pelo Homem.
    Os abutres talvez informados entre si pela energia específica que só eles entendem, atacam em grupo.
    Eu nasci e um ano e pouco depois acabou a Guerra: Um dos piores abutres humanos (e o seu bando) foi derrubado. Espero que no novo ano de 2023, outro pérfido abutre humano seja também derrubado e regresse a PAZ.
    Assim seja. Assim será.

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  3. A tua poesia fez-me comparar os abutres aos "defeitos" que encontramos e apontamos nos outros. Talvez bem observados sirvam para limpar as nossas imperfeições e assim , olhando-os no alto não terem nada de assustadores.

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  4. "Eles comem tudo e não deixam nada", eles são prenúncio de morte, e tal como as serpentes, são animais não amados. Em África há países onde os matam e usam cabeças, patas, unhas em rituais que supostamente conferem sorte ou poderes especiais. Metaforicamente, ser um abutre é um epíteto bem negativo e assim, como na vida, definimos, por vezes injustamente, o que é bom e o que é mau. É claro que, desde pequena, também os acho "feios, porcos e maus". Ainda bem que nos fazes olhar para o lado de lá do espelho.

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  5. Poema muito actual. Segundo o Google, a Fundação de Conservação do Abutre denunciou em 21.4.2020 o envenenamento de mais de 2.000 abutres só na Guiné-Bissau para rituais.
    Diferentemente, na Índia os adeptos do zoroastrismo depositam os seus defuntos em torres ou em bancadas de estádios para pasto dos abutres e purificação da carne.

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  6. Estive na Guiné Bissau no Verão de 1993. Não sei como estará agora. O que nos chega não é animador... A saída do Aeroporto foi difícil. Tinham-nos dito que nunca deveríamos entregar os passaportes. O meu marido ficou junto às nossas bagagens, com a sua nikkon para gravar rostos e paisagens. O que se podia ver era desolador. Eu acompanhei um funcionário por caminhos ocres de terra batida... Poeira, casas dispersas e umas aves de grande porte, aves de "mau agoro" sobrevoavam os céus tingidos da poeira do velho jeep em que íamos... Passaram muitos minutos, não sei quantos. Informaram que me davam os passaportes no dia seguinte. Mantive-me firme "que não, os passaportes estão em ordem, por favor, hoje levo-os comigo" . Novos conciliábulos. Olhei de novo o céu. A poeira poisara e o vermelho dourado dum sol no ocaso, aqueceu-me a esperança. E, no céu, saboreando como eu o sol a pôr - se, imensos abutres, rodopeavam suavemente...estava dentro de um Western, esperando assistir ao duelo final... Por fim, os passaportes na mão, ao encontro dum Mário lívido... Transporte para Bissau já tinha partido... Conseguimos chegar à capital no carro de serviço do aeroporto... Porquê tantos abutres? Abutres? Não DJAGUDIS são o nosso pássaro sagrado... Limpam as valas dos esgotos a céu aberto, protegem das doenças endémicas, do tifo, da cólera, são os Amigos...
    E o nosso olhar mudou... Não podíamos carregar conceitos, visões, um ver de superfície... Não, o que parecia carregar a paisagem endémica, era afinal o pássaro AMIGO. E todos os dias em que estivemos nessas terras em que tudo estava a fazer-se, em que os negócios sujos eram falados à mesa do café Lisboa por "especialistas" com pouco mais de 20 anos, em que havia gambiarras que atravessavam os Bairros sem saneamento, para haver luz e se ouvir o noticiário, os Djagudis, continuavam o seu incansável e amoroso labor... As maravilhosas mangas caiam das belíssimas mangueiras, à espera duma fábrica de sumos, os negócios da droga pululavam, na terra de Amílcar Cabral, nem uma tabuleta assinalava a sua estadia ali, os meninos vendiam ananases em carrinhos de lata fabricados pelo seu engenho que não sabíamos se um dia seria desenvolvido, as pessoas acolhedoras, tudo a fazer-se, paisagens de África MINHA, que presente, que futuro??? Mas os Djagudis, a nossa AVE SAGRADA AMIGA, limpava limpava limpava... E um dia a Guiné vai encontrar o seu Caminho, a Esperança que, em cada dia, os Djagudis Anunciam, a Guiné há - de SER Limpa, de tudo, saneamento básico com os saberes locais, limpa de tráfico de crianças, limpa de tantos negócios sujos, limpa nos olhares daqueles que não desistem de Ser... A Guiné Bissau será limpa como os Djagudis anunciam🌹💛🌈🌹

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